sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Galileu confronta a Igreja


Galileu confronta a Igreja


DO REDATOR DE DESPERTAI! NA ITÁLIA

ESTAMOS em 22 de junho de 1633. Um homem idoso e debilitado se ajoelha diante do tribunal do Santo Ofício. O réu é um dos mais renomados cientistas da época e suas convicções científicas se baseiam em longos anos de estudo e pesquisa. Mas, para não ser executado, tem de renegar o que sabe ser a verdade.

Seu nome era Galileu Galilei. O caso Galileu — como ficou conhecido — levantou dúvidas e perguntas e acirrou controvérsias que mesmo hoje, uns 370 anos depois, estão longe de desaparecer. Deixou uma marca indelével na história da religião e da ciência. O que explica tanta polêmica em torno do caso? Por que o processo que condenou Galileu ainda hoje suscita tanto interesse? O que ocorreu foi realmente uma “ruptura entre ciência e religião”, como definiu certo escritor?

Galileu é considerado por muitos como o “pai da ciência moderna”. Era matemático, astrônomo e físico, e foi um dos primeiros a estudar os céus utilizando um telescópio. Concluiu que suas observações astronômicas sustentavam uma teoria que ainda era amplamente debatida em seus dias: de que a Terra gira em torno do Sol e que, portanto, não é o centro do Universo. Por essas e outras constatações, Galileu é também considerado o pioneiro do moderno método experimental.

Quais foram algumas de suas descobertas e invenções? Como astrônomo, descobriu, entre outras coisas, os satélites de Júpiter, o fato de a Via-Láctea ser um aglomerado de estrelas, as montanhas da Lua e as fases de Vênus. Como físico, estudou leis que governam o pêndulo e a queda dos corpos. Inventou instrumentos como o compasso geométrico (uma espécie de régua de cálculo). Com base em informações que recebeu da Holanda, construiu um telescópio que abriu o Universo diante dele.

Mas um confronto prolongado com a hierarquia eclesiástica transformou a carreira do ilustre cientista num verdadeiro drama — o caso Galileu. Como tudo começou, e por quê?

Conflito com a Igreja

Em fins do século 16, Galileu já defendia a teoria de Copérnico, que declara que a Terra gira em torno do Sol e não o contrário. Essa teoria é também chamada de sistema heliocêntrico (que tem o Sol como centro). Em 1610, ao descobrir com o seu telescópio corpos celestes que nunca tinham sido observados, Galileu se convenceu de que havia encontrado a confirmação do sistema heliocêntrico.

De acordo com o Grande Dizionario Enciclopedico UTET, Galileu queria mais. Sua intenção era convencer “as mais altas figuras da época (príncipes e cardeais)” de que a teoria de Copérnico estava correta. Com a ajuda de amigos influentes, esperava vencer as objeções da Igreja e até mesmo conseguir o seu apoio.

Em 1611, Galileu viajou a Roma, onde se encontrou com clérigos da alta hierarquia e, utilizando o telescópio, mostrou-lhes as suas descobertas astronômicas. Mas as coisas não saíram como ele esperava. Em 1616, Galileu ficou sob o escrutínio da Igreja.

Para os teólogos da Inquisição, a tese heliocêntrica era uma idéia ‘estulta e absurda em filosofia, e formalmente herética, por ser expressamente contrária à Santa Escritura, no tocante ao seu sentido literal, à exposição tradicionalmente aceita e ao entendimento dos Pais da Igreja e dos doutores de teologia’.

Galileu se encontrou com o cardeal Roberto Belarmino, considerado o maior teólogo católico daquela época e denominado de “o martelo dos hereges”. Belarmino formalmente advertiu Galileu para que deixasse de promover a teoria do heliocentrismo.

Diante do tribunal de Inquisição

Galileu procurou ser mais cauteloso, mas não abandonou a tese de Copérnico. Dezessete anos depois, em 1633, compareceu ao tribunal do Santo Ofício. A essa altura o cardeal Belarmino já havia morrido, mas agora o principal adversário de Galileu era o Papa Urbano VIII, que anteriormente lhe havia sido favorável. Muitos escritores têm classificado esse julgamento como um dos mais infames e injustos da antiguidade, equiparando-o até mesmo com os julgamentos de Sócrates e de Jesus.

O motivo de sua condenação foi a publicação do livro Diálogos sobre os Dois Máximos Sistemas do Mundo, que defendia a teoria heliocêntrica. O autor recebeu ordens de se apresentar ao tribunal em 1632, mas Galileu protelou, pois estava doente e já tinha quase 70 anos. Viajou para Roma no ano seguinte, após ser intimado e ameaçado de prisão. Por ordem do papa, foi interrogado e até ameaçado de tortura.

Não se sabe ao certo se esse homem idoso e doente foi realmente torturado. Os autos de seu julgamento dizem que foi submetido a “rigoroso exame”. De acordo com Italo Mereu, historiador de direito italiano, essa frase era uma expressão técnica da época que significava tortura. Vários eruditos concordam com essa interpretação.

De qualquer forma, Galileu foi sentenciado numa sala austera diante dos inquisidores em 22 de junho de 1633. Foi declarado culpado de “ter sustentado e crido doutrina falsa e contrária às Sagradas e Divinas Escrituras, que o Sol . . . não se mova do oriente para o ocidente e que a Terra se mova e não seja o centro do mundo”.

Não querendo ser mártir, Galileu foi obrigado a se retratar. Após a leitura da sentença, o velho cientista, ajoelhado e com roupa de penitente, disse solenemente: “Abjuro, amaldiçôo e detesto os supraditos erros e heresias [teoria de Copérnico], e geralmente qualquer outro erro, heresia e seita contrária à Santa Igreja.”

Diz a tradição — para a qual não há sólida comprovação — que, após abjurar, Galileu bateu o pé e exclamou em protesto: “E no entanto se move!” Segundo comentaristas, a humilhação de renunciar às suas descobertas angustiou o cientista pelo resto dos seus dias. Ele foi sentenciado à cadeia, mas a pena foi comutada para prisão domiciliar até a sua morte. Ao perder a visão, ficou praticamente em reclusão.

Conflito entre religião e ciência?

Muitos têm concluído que o exemplo de Galileu prova que ciência e religião são totalmente incompatíveis. E de fato, no decorrer dos séculos, o processo que condenou Galileu fez com que muitas pessoas se alienassem da religião, certas de que a religião, por natureza, é uma ameaça para o progresso científico. Mas será que é realmente assim?

O Papa Urbano VIII e os teólogos da Inquisição condenaram a teoria de Copérnico, afirmando que contradiz a Bíblia. Segundo eles, a declaração de Josué — “Sol, detém-te” (Josué 10:12, Almeida) — devia ser entendida literalmente. Mas será que a Bíblia contradiz realmente a teoria de Copérnico? De forma alguma.

O que contradizia a ciência era a interpretação claramente incorreta das Escrituras. Era assim que Galileu encarava a questão. Ele escreveu a um discípulo: “As Escrituras são infalíveis, mas seus intérpretes e comentaristas cometem muitas falhas. E uma delas, muito grave e bastante freqüente, é que eles sempre se atêm a uma interpretação ao pé da letra do texto.” Todo estudioso da Bíblia concorda com isso.*

Galileu foi mais além. Afirmou que dois livros — a Bíblia e o livro da natureza — foram escritos pelo mesmo Autor e que portanto não podiam se contradizer. Acrescentou, porém, que não se poderia dizer “com certeza que todos os intérpretes falem sob inspiração divina”. Essa crítica implícita à interpretação oficial da Igreja foi provavelmente considerada uma provocação, o que resultou em o cientista ser condenado pela Inquisição. Afinal de contas, como um leigo ousava questionar as prerrogativas eclesiásticas?

O caso Galileu fez com que muitos eruditos questionassem a infalibilidade da Igreja e do papa. Segundo o teólogo católico Hans Küng, os “numerosos e indisputáveis” erros da “Santa Sé” — incluindo “a condenação de Galileu” — levantaram dúvidas sobre o dogma da infalibilidade papal.

Reabilitação de Galileu?

Em novembro de 1979, um ano após sua eleição, João Paulo II esperava fazer uma revisão do processo que condenou Galileu. Segundo admitiu o pontífice, o cientista “sofreu muito . . . às mãos de homens e organismos da Igreja”. Treze anos depois, em 1992, uma comissão nomeada pelo mesmo papa admitiu: “Certos teólogos, contemporâneos de Galileu, . . . não compreenderam o sentido profundo e não-literal das Escrituras quando elas descrevem a estrutura física do Universo criado.”

Mas o fato é que a teoria heliocêntrica não era criticada apenas por teólogos. O Papa Urbano VIII, que teve um papel de destaque no processo que condenou Galileu, foi rigoroso em insistir que o cientista não minasse o ensino tradicional da Igreja, de que a Terra era o centro do Universo. Esse ensino não era da Bíblia, mas do filósofo grego Aristóteles.

Depois que a comissão atual fez uma revisão extensiva do caso, o papa classificou a condenação de Galileu como “uma decisão precipitada e infeliz”. O cientista estava sendo reabilitado? “É um absurdo falar em reabilitação para Galileu”, diz certo escritor, “porque a História não condena Galileu, mas sim o tribunal eclesiástico”. O historiador Luigi Firpo disse: “Não cabe aos perseguidores reabilitar suas vítimas.”

A Bíblia é “uma lâmpada que brilha em lugar escuro”. (2 Pedro 1:19) Galileu a defendeu contra a interpretação errônea. Mas a Igreja, defendendo uma tradição de origem humana à custa das Escrituras, fez exatamente o contrário.

[Nota(s) de rodapé]

Qualquer leitor honesto admite prontamente que a declaração sobre o Sol ficar parado no céu não é uma análise científica, mas a descrição de um fenômeno do ponto de vista de um observador na Terra. Os astrônomos também falam com freqüência do nascer e do pôr do Sol, da Lua, dos planetas e das estrelas. Eles não querem dizer que esses corpos celestes literalmente girem em torno da Terra; apenas fazem alusão ao seu movimento aparente no céu.

[Quadro/Foto na página 14]
A Vida de Galileu
  Galileu nasceu em Pisa em 1564. Seu pai era de Florença. O jovem começou a estudar medicina na sua cidade, mas abandonou o curso por falta de interesse e dedicou-se à física e à matemática. Em 1585 voltou para casa sem obter um diploma. Contudo, conseguiu o reconhecimento dos maiores matemáticos dos seus dias, chegando a ser conferencista de matemática na Universidade de Pisa. Após a morte do pai, as dificuldades financeiras o obrigaram a mudar-se para Pádua, onde conseguiu uma posição mais lucrativa: a de professor de matemática da universidade.
  Nos 18 anos que morou em Pádua, viveu com uma jovem de Veneza, com quem teve três filhos. Em 1610 voltou a Florença, onde conseguiu uma situação financeira melhor, que lhe possibilitou
 dedicar mais tempo às pesquisas, apesar de perder a liberdade que tinha no território da República de Veneza. O grão-duque da Toscana o nomeou “primeiro filósofo e matemático”. Condenado pela Inquisição, Galileu morreu em prisão domiciliar em Florença, no ano de 1642.

[Crédito]
Do livro The Library of Original Sources, Volume VI, 1915
[Foto na página 12]
Telescópio de Galileu, que o ajudou a confirmar que a Terra não é o centro do Universo
[Crédito]
Scala/Art Resource, NY
[Fotos na página 12]
Sistema geocêntrico (que tem a Terra como centro)
Sistema heliocêntrico (que tem o Sol como centro)
[Crédito]
Fundo: © 1998 Visual Language
[Crédito da foto na página 11]
Gravura: do livro The Historian’s History of the World

Fonte: http://wol.jw.org/pt/wol/d/r5/lp-t/102003284

EPOPÉIA DE GILGAMESH E A ESCRITA DO GÊNESIS


“O passado das civilizações nada mais é que a história dos empréstimos que elas fizeram umas às outras ao longo dos séculos ...”


1. Da “corrida ao ouro bíblico” à nova historicidade das sagradas escrituras.

Em meados do século XIX, após a descoberta na antiga cidade de Nínive da biblioteca do imperador assírio Assurbanípal (668-627 a.C.), o mundo redescobriu as antigas grandes civilizações da Mesopotâmia em tábuas de argila contendo escritos em sinais mais tarde denominados cuneiformes. Civilizações estas de que até então, o pouco que se conhecia estava contido nos livros da Bíblia
, em informações “escassas e pouco reveladoras, uma vez que estavam diretamente relacionadas com a história do povo hebreu”.(CORREA, 200-, p. 2).

Tais descobertas deram início a uma espécie de “corrida ao ouro bíblico” que propunha evidenciar arqueológicamente as sagradas escrituras. Outras ruínas então, como as de Uruk, Ur e Nipur, começaram ser escavadas e revelaram mais inscrições sobre o passado do Oriente Próximo.




O trabalho de decifração destas tábuas foi realizado por vários pesquisadores, mas coube ao arqueólogo britânico George Smith, a primeira tradução contendo um trecho da Epopéia de Gilgamesh: o relato do dilúvio. Em 1872, Smith anuncia sua descoberta1 em um encontro da Sociedade de Arqueologia Bíblica causando um “forte impacto na Europa (...) por apresentar um texto pagão aparentemente antecipando a Arca de Noé”.(CORREA, 200-, p. 2).
  
Estas descobertas abalaram toda a comunidade científica e religiosa do século XIX, laicizando muitos dos objetivos iniciais, modificando métodos dos pesquisadores, e abrindo precedentes para o questionamento da veracidade dos textos bíblicos.
 

Nas últimas quatro décadas, diferentes estudos estão sendo realizados sobre os temas levantados no século XIX, tanto pela comunidade científica como em grande parte pela comunidade religiosa, fazendo com que sejam discutidos os elementos mitológicos presentes na confecção dos livros que compõe o Pentateuco2, que vão desde a formação do mundo à existência histórica dos seus patriarcas.

Há uma tentativa, nos dias atuais, por parte de arqueólogos e historiadores de remontar a bíblia separando o que é história do que são mitos e lendas.

"Apesar das paixões suscitadas por este tema, nós acreditamos que uma reavaliação dos achados das escavações mais antigas e as contínuas descobertas feitas pelas novas escavações deixaram claro que os estudiosos devem agora abordar os problemas das origens bíblicas e da antiga sociedade israelita de uma nova perspectiva, completamente diferente da anterior. (…) A história do antigo Israel e o nascimento de suas escrituras sagradas a partir de uma nova perspectiva, uma perspectiva arqueológica.” (FINKELSTEIN; SILBERMAN, 2001, pp. V-VI, p. 1).


2. Da teogonia à teofania.

Paralelamente às discussões bíblicas, as descobertas feitas pelas escavações remontam os três milênios que antecedem à Cristo, onde a região entre os rio Tigre e Eufrates viu a ascensão e queda de grandes civilizações como os sumérios, acádios, assírios e babilônicos.

Dos textos traduzidos, vários deles incompletos devido ao estado de conservação dos mesmos, pôde-se extrair muito da filosofia e da mitologia mesopotâmicas, onde podemos observar que “o Oriente antigo, antes da Bíblia, e mesmo abstraindo-se dela, não desconhecia a reflexão sobre o homem. (...) As questões fundamentais da existência, da felicidade e da infelicidade, da relação com as potências cósmicas e com o domínio misterioso dos deuses, do sentido da vida e das incertezas do destino, já tinham neles um lugar de grande importância”.(GRELOT, 1980, p. 13).

Neste universo de descobertas, os sumérios e os acadianos revelam-se fornecedores de costumes, rituais e modelos literários a todos os povos do Oriente Médio3. Suas lendas, se consideradas como o primeiro repositório das recordações históricas dos povos do oriente antigo, “se transformaram, se esquematizaram, se reagruparam, mudaram eventualmente de país, se ampliaram, às vezes, desmedidamente” (GRELOT, 1980, p. 13), onde cada cultura apropriou-se de um mito conforme a sua ótica4.
           
Não diferente desta regra, os israelitas inovaram ao excluir todo um panteão, centralizando sua fé num deus único, propondo uma desmitização do universo transformando as forças cósmicas ao que de fato são. A situação do homem diante de Deus modifica-se totalmente, “embora, na prática, a adaptação da mentalidade corrente dos israelitas a essa mudança radical se tenha processado lentamente e com dificuldade” (GRELOT, 1980, p. 15), mantendo grande parte do antigo modo de expressar religioso herdado dos sumérios e acádios.

Desta forma, Israel começa a escrever sua própria história, ora compilando fatos de seu próprio povo em grandiosas lendas, ora adaptando mitos antigos à sua realidade e aos seus propósitos. As histórias contidas na parte hebraica da bíblia, embora difíceis de serem datadas pelos anacronismos que ali apresentam5, foram compiladas e ordenadas “principalmente, no tempo do rei Josias (640-609 a.C.), para oferecer uma legitimação ideológica para ambições políticas e reformas religiosas específicas”.(FINKELSTEIN; SILBERMAN, 2001, p. 14).


3. A Epopéia de Gilgamesh e sua influência sobre demais literaturas do mundo antigo.

Considerada a mais antiga obra literária da humanidade, a Epopéia de Gilgamesh na sua forma “tardia” (século VII a.C.) como é difundida no Ocidente (TIGAY6 citado por ZILBERMAN (1998, p. 58)), não foge à regra das obras de origens mesopotâmicas: um compilado de lendas e poemas, cuja origem e veracidade perdem-se na difusão oral, adaptação cultural e textos fragmentados.

As narrativas contidas na epopéia deviam ser muito populares em sua época, pois são encontradas em várias versões escritas por vários povos e línguas diferentes, sendo que as primeiras versões da mesma, datam do Período Babilônico Antigo (2000-1600 a.C.), podendo ter surgido muito antes7, pois o herói desta epopéia é o lendário rei sumério Gilgamesh, quinto rei da primeira dinastia pós-diluviana de Uruk, que teria vivido no período protodinástico II (2750-2600 a.C.)8.

Devido à sua antiguidade e originalidade, muito se especula sobre a influência desta sobre textos mais difundidos e conhecidos pela humanidade, como os poemas épicos gregos Ilíada e Odisséia de Homero, escritos entre VIII e VII a.C.. Mas a polêmica é maior quando se comparados às narrativas do Pentateuco, a parte mais antiga do Velho Testamento, datadas do Primeiro Milênio a.C.. No caso desta última, o que legitima-nos a observar as influências, além de semelhanças impressionantes, o próprio contexto histórico e geográfico. Contexto este em que a origem dos hebreus e das grandes civilizações semitas são mescladas com a própria história do povo sumério. Históricos períodos de cativeiro, onde a aculturação era, além de inevitável pelas circunstâncias de sobrevivência, uma forma de dominação ideológica:


“O povo dominado era absorvido pelos nativos ao serem levados, havia a destruição total da nacionalidade, do culto, das instituições, nada ficando que pudesse ser lembrado a fim de que jamais alguém se encorajasse a agir em favor de uma reconstrução. Todo o elemento que representasse qualquer valor moral ou intelectual era desterrado e em seu lugar era posto outro povo trazido de outras regiões.” (LOPES, 200-, p. 2).




            
As semelhanças narrativas encontradas entre Epopéia de Gilgamesh e o Livro do Gênesis iniciam-se logo nos primeiros versículos da bíblia, ou seja, na criação do homem. O povo de Uruk, descontente com a arrogância e luxúria do rei Gilgamesh, exige dos seus deuses a criação de um homem que fosse o reflexo do rei, e tão poderoso quanto ele para que pudesse enfrentá-lo e redimi-lo. O deus Anu, ouvindo o lamento da população, ordenou a Aruru, deusa da criação, que fizesse Enkidu:

“A deusa então concebeu em sua mente uma imagem cuja essência era a mesma de Anu, o deus do firmamento. Ela mergulhou as mãos na água e tomou um pedaço de barro; ela o deixou cair na selva, e assim foi criado o nobre Enkidu”.(SANDARS, 1992, p. 94).

“Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”.(GENESIS, cap. 1, ver. 26).

“Então formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente”.(GENESIS, cap. 2, ver. 7).


Enkidu foi criado inocente, longe da malícia da civilização, vivendo entre as criaturas selvagens e compartilhando a natureza com elas:


“Ele era inocente a respeito do homem e nada conhecia do cultivo da terra. Enkidu comia grama nas colinas junto com as gazelas e rondava os poços de água com os animais da floresta; junto com os rebanhos de animais de caça, ele se alegrava com a água”.(SANDARS, 1992, p. 94).

“Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento. E a todos os animais da terra e a todas as aves dos céus e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhes será para mantimento”. (GENESIS, cap. 1, ver. 29-30).


O rei Gilgamesh, sabendo da existência de Enkidu, incube uma missão a uma das prostitutas sagradas do templo da deusa Ishtar (deusa do amor e da fertilidade): seduzir Enkidu e trazê-lo para dentro das muralhas de Uruk. Enkidu deixou-se seduzir pela rameira e perdeu sua inocência, além de seu poder selvagem, tornando-se conhecedor da malícia do homem. Arrependido, lamenta-se, mas a rameira consola-o enfatizando as vantagens desta nova vida que está por vir:


“Enkidu perdera sua força pois agora tinha o conhecimento dentro de si, e os pensamentos do homem ocupavam seu coração”.(SANDARS, 1992, p. 96).

“Olho para ti e vejo que agora és como um deus. Por que anseias por voltar a correr pelos campos como as feras do mato?” (SANDARS, 1992, p. 99).
                       
“Porque Deus sabe que no dia em que comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal.” (GENESIS, cap. 2, ver. 5).


Nesta comparação com a tentação no Éden, não identificamos diretamente os fatos, mas sim, as idéias. A prostituta sagrada, condenada também em outros livros da bíblia, pode ser compilada como o fruto proibido, a serpente e a própria Eva, com o poder de seduzir o homem e tirar sua inocência com falsas promessas.


Enkidu, já na cidade de Uruk, enfrenta o rei Gilgamesh em combate. Vencendo-o, é reconhecido pelo rei como irmão, pois este jamais havia enfrentado alguém com tamanha força. Formando-se então uma grande amizade que protagoniza grandes aventuras e tragédias ao longo da epopéia.

Gilgamesh e Enkidu partiram então para a floresta de cedros (provavelmente, o atual Líbano), onde enfrentaram o monstro Humbaba, a sentinela da floresta.
Este se irrita com Enkidu, por profanar a floresta sagrada dos cedros inferiorizando-o e humilhando-o com palavras semelhantes às palavras de Deus, ao condenar o homem por comer do fruto proibido. Novamente não vemos relação direta entre os fatos, mas uma linha comum de pensamento é verificada entre os textos onde, a profanação e a desobediência são punidas com a servidão:

“… tu, um mercenário, que depende do trabalho para obter teu pão!” (SANDARS, 1992, p. 119).

“… maldita é a terra por tua causa: em fadigas obterás dela o sustento durante os dias da tua vida”.(GENESIS, cap. 3, ver. 16).

“No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado”.(GENESIS, cap. 3, ver. 19).

Os heróis, com a ajuda de Shamash (deus sol, protetor de Gilgamesh), matam o monstro Humbaba cortando-lhe a cabeça. Fato que irritou o poderoso Enlil (deus da terra, do vento e do ar universal), que exigiu a vida de um dos heróis pelo insulto.

A deusa Ishtar, vendo a força e beleza do herói, apaixona-se por Gilgamesh que a despreza, provocando a cólera da deusa. Então, Ishtar enviou a terra, um monstro com a missão de destruir o herói: o Touro Celeste. Mas a dupla de heróis novamente é vitoriosa. Então, Enkidu zomba da deusa derrotada atirando-lhe pedaços do touro mutilado. Enlil enfurecido com a atitude do mortal decide enfim qual dos dois heróis deverá morrer. Enkidu então adoece e, sucumbindo à doença, impulsiona o rei Gilgamesh a sua missão final: a busca da imortalidade.

A primeira semelhança encontrada pelos tradutores das tábuas em escrita cuneiforme é a mais impressionante. Foi a mola propulsora de toda a discussão sobre a veracidade dos textos bíblicos, pois a descrição do dilúvio não só é a mais bem conservada tábua de toda a epopéia, mas a mais rica em detalhes e semelhanças com a descrição no Gênesis. Além de que, outras narrativas do dilúvio foram encontradas em forma de poemas isolados e com outros personagens, como as tábuas de Atra-Hasis, a Epopéia de Erra, e os textos do rei Ziusudra9.

Na epopéia, Gilgamesh parte em busca da imortalidade, e para isso, precisa obter este segredo dos deuses com o imortal Utnapishtim (Noé do Gênesis). Para encontrar o imortal, Gilgamesh enfrentou uma longa jornada, cheia de perigos e provações. Ao encontrar Utnapishtim, ouve que este não poderá lhe tornar imortal, mas poderá revelar ao herói como se tornara um e conta do dia em que os deuses, desgostosos com a sua criação (a humanidade), resolveram eliminá-la da terra:


“Naqueles dias a terra fervilhava, os homens multiplicavam-se e o mundo bramia como um touro selvagem. Este tumulto despertou o grande deus. Enlil ouviu o alvoroço e disse aos deuses reunidos em conselho: ‘O alvoroço dos humanos é intolerável, e o sono já não é mais possível por causa da balbúrdia.’ Os deuses então concordaram em exterminar a raça humana”.(SANDARS, 1992, p. 149).
“Viu o Senhor que a maldade do homem se havia multiplicado na terra, e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração”.(GENESIS, cap. 6, ver. 5).

“A terra estava corrompida à vista de Deus, e cheia de violência”.(GENESIS, cap. 6, ver 11). 

“Farei desaparecer da face da terra o homem que criei, o homem e o animal, os répteis, e as aves do céu; porque me arrependo de os haver feito”.(GENESIS, cap. 6, ver 7). 


Ea (deus da água doce e da sabedoria, patrono das artes e protetor da humanidade), avisa Utnapishtim em um sonho das intenções de Enlil e orienta-o de como sobreviver à catástrofe que estaria por vir:

“... põe abaixo tua casa e constrói um barco. Abandona tuas posses e busca tua vida preservar; despreza os bens materiais e busca tua alma salvar. Põe abaixo tua casa, eu te digo, e constrói um barco. Eis as medidas da embarcação que deverás construir: que a boca extrema da nave tenha o mesmo tamanho que seu comprimento, que seu convés seja coberto, tal como a abóbada celeste cobre o abismo; leva então para o barco a semente de todas as criaturas vivas. (...) Eu carreguei o interior da nave com tudo o que eu tinha de ouro e de coisas vivas: minha família, meus parentes, os animais do campo – os domesticados e os selvagens – e todos os artesãos”.(SANDARS, 1992, p. 149-151).

“Faze uma arca de tábuas de cipreste; nela farás compartimentos, e a calafetarás com betume por dentro e por fora. Deste modo a farás: de trezentos côvados será o comprimento, de cinqüenta a largura, e a altura de trinta. Farás ao seu redor uma abertura de um côvado de alto; a porta da arca colocarás lateralmente; farás pavimentos na arca: um em baixo, um segundo e um terceiro”. (GENESIS, cap. 6, ver 14-16). 

“… entrarás na arca, tu e teus filhos, e tua mulher, e as mulheres de teus filhos. De tudo o que vive, de toda carne, dois de cada espécie, macho e fêmea, farás entrar na arca, para os conservares contigo”.(GENESIS, cap. 6, ver. 18).


Enlil então envia uma tempestade de grandiosas proporções, fazendo com que toda a terra desaparecesse sobre as águas:


“Caiu a noite e o cavaleiro da tempestade mandou a chuva.(...) Por seis dias e seis noites os ventos sopraram; enxurradas, inundações e torrentes assolaram o mundo; a tempestade e o dilúvio explodiam em fúria como dois exércitos em guerra.” (SANDARS, 1992, p. 151-153).

“… nesse dia romperam-se todas as fontes do grande abismo, e as portas do céu se abriram, e houve copiosa chuva sobre a terra durante quarenta dias e quarenta noites”.(GENESIS, cap. 7, ver. 11-12).


E toda a humanidade foi exterminada:


“… agora eles (humanos) flutuam no oceano como ovas de peixe”. (SANDARS, 1992, p. 152).
“Assim foram exterminados todos os serem que havia sobre a face da terra …” (GENESIS, cap. 7, ver. 23).
                   
    
  Com o passar dos dias, a tempestade ameniza-se e o dilúvio começa a serenar:


“Na alvorada do sétimo dia o temporal vindo do sul amainou; os mares se acalmaram, o dilúvio serenou”.(SANDARS, 1992, p. 153).
“Deus fez soprar um vento sobre a terra e baixaram as águas. Fecharam-se as fontes do abismo e também as comportas dos céus, e a copiosa chuva do céu se deteve”. (GENESIS, cap. 8, ver. 1-2).


Após a calmaria do grande oceano que se formara, Utnapishtim solta uma pomba para ver se há terra firme para que então possa desembarcar:


“Na alvorada do sétimo dia eu soltei uma pomba e deixei que se fosse. Ela voou para longe; mas, não encontrando lugar para pousar, retornou. Então soltei uma andorinha, que voou para longe; mas, não encontrando lugar para pousar, retornou. Então soltei um corvo. A ave viu que as águas haviam abaixado; ela comeu, voou de uma lado para outro, grasnou e não mais voltou para o barco”.(SANDARS, 1992, p. 153).

“Ao cabo de quarenta dias, abriu Noé a janela que fizera na arca, e soltou um corvo, o qual, tendo saído, ia e voltava, até que se secaram as águas sobre a terra. Depois soltou uma pomba para ver se as águas teriam já minguado da superfície da terra; mas a pomba, não achando onde pousar o pé, tornou a ele para a arca; porque as águas cobriam ainda a terra. Noé, estendendo a mão, tomou-a e a recolheu consigo na arca. Esperou ainda outros sete dias, e de novo soltou a pomba for a da arca. A tarde ela voltou a ele; trazia no bico uma folha nova de oliveira; assim entendeu Noé que as águas tinham minguado de sobre a terra. Então esperou ainda mais sete dias, e soltou a pomba; ela, porém, já não tornou a ele”.(GENESIS, cap. 8, ver. 6-12).
           

Após a bonança, já em terra firme e grato ao deus Ea por ter lhe salvo a vida, Utnapishtim prepara um sacrifício aos deuses:

“Eu então abri todas as portas e janelas, expondo a nave aos quatro ventos. Preparei um sacrifício e derramei vinho sobre o topo da montanha em oferenda aos deuses”.(SANDARS, 1992, p. 153).

“Então Noé removeu a cobertura da arca, e olhou, e eis que o solo estava enxuto”.(GENESIS, cap. 8, ver 13).

“Levantou Noé um altar ao Senhor, e, tomando de animais limpos e de aves limpas, ofereceu holocaustos sobre o altar”.(GENESIS, cap 9, ver 20).


            Enlil, furioso com Ea por ter permitido que um humano sobrevivesse e conhecendo o segredo dos deuses, viu-se sem alternativa que não a de transformar Utnapishtim em um imortal, para que sua maldição de que nenhum mortal sobrevivesse se completasse.

Gilgamesh desapontado por não ter tido sucesso em busca da imortalidade, prepara seu retorno para Uruk, mas é abordado pela esposa de Utnapishtim que, compadecida com o fracasso do herói, revela-lhe o segredo da imortalidade em que, nas profundezas do mar, havia uma planta maravilhosa, e quem a comesse, seria eternamente jovem. O herói então mergulha no mar profundo, ferindo-se, mas obtendo a tão desejado segredo.

Tomado de rara compaixão, Gilgamesh decide não comer sozinho o maravilhoso fruto, mas sim dividi-lo com os anciãos da cidade de Uruk. No retorno para casa, Gilgamesh é surpreendido por uma serpente marinha que lhe rouba a flor, perdendo para sempre o segredo da imortalidade:


“Se conseguires pegá-la (a planta sagrada), terás então em teu poder aquilo que restaura ao homem sua juventude perdida. (…) Vem ver esta maravilhosa planta. Suas virtudes podem devolver ao homem toda a sua força perdida. (...) mas nas profundezas do poço havia uma serpente, e a serpente sentiu o doce cheiro que emanava da flor. Ela saiu da água e a arrebatou”.(SANDARS, 1992, p. 160).


Apesar dos fins da ação de comer o fruto sejam diferentes (a morte e a imortalidade), podemos fazer uma analogia da função da serpente em roubar a imortalidade do homem: sendo tirando-lhe a oportunidade da vida eterna pela sua obtenção, como na Epopéia de Gilgamesh; sendo condenando-lhe a morte pela cessão do fruto ao homem, como no livro do Gênesis. Gilgamesh então ficou desolado e abatido, pois além de fracassar em sua missão, perdera para sempre o irmão Enkidu, restando-lhe apenas, melancolicamente esperar o dia de sua morte chegar.

No livro do Gênesis, não encontramos somente semelhanças com a Epopéia de Gilgamesh, mas com outros textos antigos, como o sumeriano Mito de Dilmum onde o deus Enki, o senhor das águas profundas e do abismo que suporta a terra; e Nintu, a virgem pura, deusa que presidia aos partos; habitavam sozinhos num mundo cheio de delícias sem que nada existisse além do par divino, caracterizando uma descrição muito semelhante do que seria e onde seria o jardim Éden:
           

“E plantou o Senhor Deus um jardim no Éden, da banda do Oriente, e pôs nele o homem que havia formado. (...) E saía um rio do Éden para regar o jardim, e dali se dividia, repartindo-se em quatro braços. (...) O nome do terceiro rio é Tigre; é o que corre pelo oriente da Assíria. E o quarto é o Eufrates”. (GENESIS, cap. 2, ver. 8-14).


5. Considerações finais.

É impossível afirmar a influência direta da Epopéia de Gilgamesh sobre a escrita do livro do Gênesis, pois tanto um como o outro poderiam ter sido influenciados por histórias ainda mais antigas e difundidas no Oriente, ao mesmo tempo em que é inegável que o mundo situado entre o Mediterrâneo e os Montes Zargos, onde havia intensa circulação de mercadores de diferentes etnias e religiões variadas, era pequeno demais para descartar qualquer influência cultural entre eles.

Os hebreus, possivelmente muito antes de seus períodos de cativeiro na Babilônia e Assíria, já tiveram contato com as lendas e mitos sumério-acadianos e que por várias razões, os utilizaram na formulação de suas próprias lendas, o que sugere que seu deus, Jeová, toma por empréstimo características de deuses como Anu, Enlil e Ea, seja criando a terra e o homem, seja julgando-os por seus atos, seja compadecendo-se de seu povo e os protegendo.

Acreditamos ser impossível obter conclusões definitivas sobre as influências de um texto sobre o outro, ou principalmente, da formação de um pensamento religioso sem a existência do pensamento antecessor, sem que se faça juízo de valores como é recomendado a um historiador, mas ao se estudar o contexto em que o Gênesis é idealizado e escrito, tomando aqui, palavras de Finkelstein e Silberman, observa-se que "a saga histórica contida na Bíblia (...) não foi uma revelação miraculosa, mas um brilhante produto da imaginação humana”.10


Notas

1SANDARS, N. K. A epopéia de Gilgamesh. São Paulo: Martins Fontes, 1992, p. 11-12.

2Os 5 primeiros livros da Bíblia: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.

3GRELOT, P. Homem quem és? São Paulo: Edições Paulinas, 1980, p. 14.

4CHARTIER, Roger. Textos, impressão, leituras. In: HUNT, Lynn. A nova história cultural. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 211-238.

5FINKELSTEIN, Israel; SILBERMAN, Neil Asher. The Bible Unearthed. Archaeology's New Vision of Ancient Israel and the Origin of Its Sacred Texts. New York: The Free Press, 2001, p. 38.

6TIGAY, Jeffrey. On the evolution of the Gilgamesh epic. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1982, p. 11.

7ZILBERMAN, Regina. Nos princípios da epopéia: Gilgamesh. In: BAKOS, Margaret Marchiori; POZZER, Katia Maria Paim. JORNADA DE ESTUDOS DO ORIENTE ANTIGO: LÍNGUAS ESCRITAS E IMAGINÁRIAS, 3., 1997, Porto Alegre. Anais ... trabalho 4. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998, p. 58.

8BOUZON, Emanuel. Ensaios babilônicos: sociedade, economia e cultura na Babilônia pré-cristã. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998, p. 126.

9CHARPIN, Dominique. El mundo de la biblia: Mesopotamia y la biblia. Valencia: EDICEP, 1984, p. 9.

10FINKELSTEIN; SILBERMAN. The Bible ... 2001. p. 13.

Fonte:
Eric Thomas FollmannNúcleo de Estudos Históricos e Arqueológicos UNIANDRADE